Gangrena Gasosa em entrevista antes do show de Curitiba

Pioneiros do Saravá Metal vão apresentar sua mistura de macumba e rock ‘n’ roll

Neste próximo sábado (19 de outubro), o Gangrena Gasosa, único grupo de Saravá Metal, estará em Curitiba para realizar show no Hangar Bar. Com uso de figurinos inusitados e influências da macumba, a banda elaborou um estilo único no heavy metal nacional, se autodenominando o “primo pobre do Black Metal”. Vale recordar que o Gangrena surgiu no início da década de 90 em um cenário cultural de efervescência que foi caracterizado pela mistura de estilos regionais brasileiros com o rock ‘n’ roll. Para falar sobre o estilo da banda, as experiências na carreira e as influências, conversamos com o vocalista Angelo Arede, que concedeu a entrevista exclusiva a seguir antes de chegar a capital paranaense:

O Gangrena Gasosa se denomina o primeiro e único grupo de Saravá Metal. Como é este estilo e como a banda o desenvolveu?

Saravá Metal é a tradução do Metal Anglo-Saxão pra nossa balbúrdia pindorâmica. Nem Oswald de Andrade poderia prever esse naipe de antropofagia, dessa poesia do Pau-Brasil virando a poesia do Pau-comendo-solto-na-casa-de-Noca. Desenvolvimento é democratizar o rock pesado cantando em português, encerrando de vez o vexame do embromation ao urrar suas músicas preferidas, falando do ocultismo que realmente provoca aquele cagaço sinistro de desrespeitar, além de falar também do espírito de porco tupiniquim. Tudo com muita batucada brasileira.

Com influências da macumba, dá para dizer que este seria realmente o Black Metal brasileiro? Por quê?

Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Cada um no seu quadrado, mas Hail Satan ou falar de entidades Lovecraftianas de RPG que nem existem não funciona muito pra quem tá acostumado a passar em frente a despachos com cabeça de bode ou galinhas pretas degoladas e já fez feitiço pradar um preju nos outros. Digamos que somos o primo pobre do Black Metal que é mais desbocado, mas se diverte muito mais.

Quais nomes foram importantes e influentes para a banda?

A banda foi criada pra abrir um show do Ratos de Porão. Influência-mor. Além disso, no começo dos anos 90 o bicho tava pegando, todo mundo queria ser tipo Thrash Metal da Bay Area que nem Exodus e Slayer, maluco. Ainda tinha o Sepultura se estabelecendo como potência do metal mundial, Ratos já tinha o Brasil, tinha Nuclear Assault, Kreator. Desse caldeirão da época saiu o Saravá Metal. Só que era tudo fodido, suburbano com instrumento emprestado e se vestir de entidade de macumba foi a forma prática e experimental de desviar a atenção do fato que ninguém sabia tocar direito.

No Brasil, quais locais o estilo do Gangrena Gasosa tem mais penetração?

São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Paraná. Se juntar Norte e Nordeste ultrapassa São Paulo.

Se a banda tivesse que indicar um disco próprio que sintetiza seu estilo e mais marcante, qual seria?

Gente Ruim Só Manda Lembrança Pra Quem Não Presta, de 2018.

A banda surgiu no início da década de 90. Vocês acham que naquela época o cenário cultural brasileiro estava mais propício à mistura de estilos distintos?

Acho que sim. Hoje em dia, pelo menos na música pesada, as coisas voltaram a ficar mais herméticas.

E hoje como vocês avaliam o cenário do rock nacional?

Tem muita coisa boa rolando, a cena cresceu bastante e mesmo com uma certa banalização do CD, o rock seguiu firme e forte. Apesar de menos holofote que os outros estilos, o roqueiro é muito fiel e não deixou a peteca cair. Depois disso a ascensão das plataformas digitais reaqueceu o mercado musical, levando o rock junto. Acho que o hermetismo que citei anteriormente contribui pra que ainda fiquemos bem atrás dos outros gêneros musicais. Pra mim o rock deveria fazer como a cena carimbó do Pará, juntando bandas e artistas em shows, músicas e projetos. Precisamos parar com essa parada de que a minha vitória será maior que a sua. Junta todo mundo que sobe geral. A mistura precisa acontecer, de outros estilos com o rock e metal e de todos os artistas em coletivos. Funciona com o carimbó, com o sertanejo, com o rap e funciona com o pop do mundo inteiro. Isso não torna o rock menos rock, só fortalece.

Com este estilo original, a banda já teve experiências no mercado internacional? Se sim, como foi?

Organizei a tour europeia de 2001 e as coisas funcionaram muito bem mesmo tendo sido sem a caracterização das entidades da umbanda, que fui contra mas fui voto vencido. A tour causou ótimas viagens nos gringos e estava tudo encaminhado pra guitarra do ‘Smells Like a Tenda Spirita’ (álbum) ser regravada e o disco ser remixado nos EUA, mas quando voltamos rolou uma instabilidade que era muito comum acontecer naqueles tempos e melou. Tenho certeza que hoje em dia as coisas funcionariam muito melhor do que em 2001. A banda evoluiu bastante musical e profissionalmente. Está nos planos fazer esse batuque lá fora de novo e ainda vai se ouvir muito no termo que nos atribuíram na gringa, o “Voodoocore”.

Foto: Diego Padilha
Entrevista: André Molina