Pioneiro do Hard Rock Brasileiro analisa estilo e o “Dia Mundial do Rock”

Rolando Castello Júnior esteve na fundação da Patrulha do Espaço ao lado de Arnaldo Baptista, dos Mutantes

Construir uma sólida e longa carreira no Rock ‘N Roll não é uma tarefa fácil no Brasil. Ainda mais ser pioneiro de uma das vertentes mais pesadas: o Hard Rock. Então… Nada mais justo do que no “Dia Mundial do Rock”, comemorado neste 13 de julho, conversar com o baterista Rolando Castello Júnior, que está na ativa desde o início da década de 1970.

Considerado o terceiro “melhor baterista do Brasil de todos os tempos” pela renomada revista Roadie Crew em 2015, Júnior estreou no primeiro álbum do Made In Brazil. O famoso disco da banana, de 1974. Também participou da banda Aeroblus na Argentina e da fundação do cultuado grupo “Patrulha do Espaço” ao lado do ex-líder dos Mutantes, Arnaldo Baptista. Após a saída de Arnaldo, decidiu manter as atividades da Patrulha, que desenvolveu um som mais pesado e se tornou pioneira do Hard Rock no Brasil, gravando Lps importantes na década de 80 de maneira independente, além de realizar inúmeras turnês.

Entre as lembranças que gosta de recordar, destaca os shows de abertura da Patrulha do Espaço na única turnê brasileira realizada pelo consagrado Van Halen, em 1983.

Sobre o “Dia Mundial do Rock”, não está otimista por causa da pandemia do coronavírus, que atingiu em cheio a área cultural. Porém, ele não para. O músico promove relançamentos, monta novas bandas e mantém a carreira no Brasil e na Argentina. Agora em 2020, divulga o novo grupo CaSch e comemora o aniversário de 40 anos do clássico álbum preto da Patrulha do Espaço.

Nesta segunda-feira (13 de julho) é o “Dia Mundial do Rock”. Você como expoente do rock brasileiro desde a década de 1970, com gravações de álbuns clássicos com Made In Brazil, Arnaldo Baptista e a Patrulha do Espaço, como avalia as comemorações?

Neste momento de pandemia mundial e que no Brasil somos testemunhas de um total desgoverno e falta de gestão efetiva contra essa doença e com dezenas de milhares de mortos, não há como comemorar o Dia Mundial do Rock, as comemorações serão pífias, como o atual governo. É um péssimo momento para a música em geral.

Acha que é uma data para refletir sobre o Rock Nacional? Pois o estilo foi bem mais prestigiado no Brasil na década de 1980.

Sem dúvida pode se dizer que a nível história, reconhecimento massivo, e da mídia, para muitos o rock nacional começa nos anos 80, o que é uma mentira e uma injustiça, o que nada me surpreende, já que definitivamente somos um país sem memória. A reflexão fica por conta que na verdade o rock nacional dos anos 80 consagrou em sua grande maioria bandas pops e não de rock, estabelecendo um padrão meio equivocado do que é rock, fato este que, lamentavelmente, perdura até os dias de hoje.

Inclusive aproveitamos para citar que na década de 1980 a Patrulha do Espaço fez os shows de abertura do Van Halen no Brasil. Gostaria que você recordasse para nós como era a cena na época, pois o Van Halen fez um dos primeiros shows internacionais de Hard Rock no Brasil. Como foram estes shows?

A cena na época era difícil, mas já havíamos conquistado nosso espaço principalmente em São Paulo, capital e interior, o que facilitava e muito nosso trampo. Também tínhamos uma forte base de fãs no Rio Grande do Sul, três discos independentes e muitíssimos shows e estrada na bagagem da banda. Então foi uma consagração para a banda abrirmos o Van Halen em Sampa e uma vitória do movimento de rock nacional naquele momento, pois representávamos todas as bandas que tanto batalharam e que não conseguiram seu lugar ao sol. Os shows foram ótimos a nível ‘performance’ da banda e resposta do público, mas ao mesmo tempo foram tensos, pois era um momento que tínhamos quase todo nosso equipamento em manutenção e havíamos desmobilizado nossa equipe técnica, então, fomos pegos totalmente desprevenidos, ainda que meses antes me tivessem dito que abriríamos o Van Halen, não acreditei nessa possibilidade e muito menos que os caras viriam, então só recebemos a confirmação mesmo dessa gig um dia antes, o que nos pegou nesse despreparo que comento, mas enfim, fomos lá com a cara e a coragem e deu tudo super certo.

A Patrulha foi uma das primeiras bandas em São Paulo e no Brasil a investir no Hard Rock?

Sem dúvida. Sempre gostei de rock pesado e meus companheiros de banda também, mas antes de nós houve outras bandas que também investiram nessa corrente do rock e que não tiveram o reconhecimento merecido, pela dificuldade que era tudo por aqui, fora que algumas dessas bandas acabaram amolecendo seu som por mil motivos. Já para nós sempre foi e será nosso estilo e assim mantemos isso até os dias de hoje, senão não teria sentido continuar com a banda.

Que eu saiba seu primeiro álbum foi a estreia do Made In Brazil. Um clássico do rock nacional. Como você ingressou na banda e como foram as gravações deste importante álbum?

Eu já conhecia o Made desde 1968, era amigo dos caras. Em 1969 fui morar no México, onde considero que foi meu mestrado em rock. Quando retornei ao Brasil, em 1973, fiz diversos trampos na música, até que em 1974, antes de gravar seu primeiro disco o Made me convidou, pois precisavam de um batera, digamos mais consistente. A gravação foi meu batismo de fogo. A gravadora RCA tinha um baita estúdio e tivemos o que melhor havia em termos de estrutura técnica e artística para a gravação desse disco, adoro esse trampo. Depois fizemos muita televisão e entrevistas na época e centenas de shows. Naquele momento acho que éramos a banda que mais trabalhava. Foram quase dois anos de muitíssimo trabalho, tipo 24 horas por dia, sete dias da semana de disponibilidade para banda, até que em um momento quis tocar outras coisas e me mandei.

Em seguida você foi tocar com o Arnaldo Baptista (Ex-Mutantes) e então surgiu a Patrulha do Espaço?

Na verdade, depois do Made montei um trio, sempre os trios, que misturava hard rock e progressivo, tivemos alguns nomes, mas nunca um em definitivo e só existimos em nossos exaustivos ensaios. No Made tocava uma bateria mais reta, quadrada como falamos no meio, e nessa outra banda os tempo eram intrincados e as canções tinham mil partes, algo típico do progressivo, ainda que nunca tocamos ao vivo. Graças a esse trampo árduo para armar essas músicas, acabei me preparando para minha próxima aventura musical que foi o Aeroblus na Argentina, sem dúvida um ponto alto em minha carreira, tanto que essa banda me abriu as portas para que hoje eu tenha uma carreira bastante criativa e gratificante na Argentina. Então, só depois do Aeroblus é que rolou isso de tocar com o Arnaldo. Na verdade eu estava meio de férias no Brasil, quando o Kokinho, baixista, me convidou para Patrulha. Um convite semi irrecusável. Ademais, eu estava cansado da repressão na Argentina, então, aceitei o convite e acabei ficando por aqui.

Algum fato interessante que você não se esquece de ter vivido com o Arnaldo Baptista na gravação do álbum?

O lance mais interessante é que gravamos o disco ao vivo, inclusive a voz. Tocamos como num ensaio e gravamos tudo, como estávamos super bem ensaiados foi tudo muito fácil. O detalhe é que esse disco nunca foi propriamente mixado, pois as negociações não avançaram, então, o que escutamos é uma mixagem grosseira feita como uma referência para os músicos, ainda assim, o disco é bom pacas. Imagina se tivéssemos mixado corretamente.

Após a saída do Arnaldo, a Patrulha do Espaço se tornou uma banda pioneira do hard rock brasileiro gravando diversos álbuns de forma independente. Era muito difícil começar a fazer som pesado no Brasil? Como você analisa os álbuns da Patrulha do Espaço gravados na década de 1980?

Sim. Foi tudo muito difícil. Produzir um disco e prensá-lo era caríssimo. Havia muito mais dificuldade do que facilidade, portanto era muito difícil fazer os discos, mas tínhamos uma vantagem, nossos fãs, e graças a eles pudemos manter uma produção de um disco por ano. Isso somado ao forte trampo de estrada. Foi o sustentáculo da banda naqueles tempos de ditadura e de uma mídia adversa. Os álbuns foram todos gravados e mixados em 30 horas, cada um, ou seja, em muito pouco tempo. Isso se deve ao fator financeiro. Os estúdios também eram caríssimos. Então, só conseguimos fazê-los nesse tempo porque íamos muito bem preparados para o estúdio. Hoje quando os ouço, vejo que na verdade não gravamos discos, fizemos milagres.

Você teve passagem também no rock argentino na banda Aeroblus. Como você construiu sua carreira lá? Até hoje vejo que você promove eventos naquele país.

Fiquei décadas sem voltar para Argentina depois do Aeroblus, em 1976/1977. Foi no começo do século. Lá pelos 2000, que comecei a notar que havia uma forte demanda pelo som do Aeroblus. Isso no Brasil. Nem ideia de que na Argentina era igual ou mais forte ainda esse imenso interesse pela banda, mas isso eram ecos em minha mente, estava totalmente absorto com o retorno da Patrulha à estrada, naquele novo século que começava. Só em 2010 foi que retornei a Argentina, e falar em “retorno triunfal” seria a expressão da verdade, desde então, tenho ido várias vezes ao ano para lá, onde toco com bandas que armo com amigos, tocamos também com a Patrulha e CaSch, shows espetaculares e também gravo muito por lá, com grandes nomes do rock argentino e outros nem tanto. Mas promissores talentos, resumindo em uma palavra. Minha carreira por lá é muito “intensa” de verdade, deveria ter voltado em março passado para mais shows e gravações, mas como todos sabemos o planeta parou.

Quando esteve em Curitiba produziu a coletânea “Cemitério de Elefantes” no fim da década de 80, que revelou importantes bandas paranaenses. Como foi a gravação deste álbum?

Sim. Foi muito bom produzir e participar desse disco. A cena em Curitiba era riquíssima, mas desconhecida. Poder dar uma movimentada nisso foi demais e muito gratificante, mas minha dedicação e interação com a cidade foi muito maior do que com o disco “Cemitério de Elefantes”. Por aí produzi um disco da Relespublica, que são uns gênios esses caras; posso dizer que dei uma boa força ao Blues, levando o André Christovam para tocar varias vezes em Curitiba. Também levei e trabalhei com o Terço e Golpe de Estado, na capital e interior do Paraná. Produzi três históricos eventos chamados Encontros de Bateristas em Curitiba, enfim, tenho uma ligação muito forte com Curitiba e o Paraná, até os dias de hoje, estou sempre produzindo, tocando e gravando por aí. Adoro Curitiba. Tenho muitos bons amigos por aí e músicos admirados. E tudo isso começou lá por 1978, com nossa amizade com o grande Ivo Rodrigues e o não menos grande, Carlão Gaertner, da saudosa banda Chave.

E atualmente quais trabalhos você vem fazendo? Tem a banda Cash, que é mais pesada.

Era para estarmos fazendo uma pequena tour em cinco capitais, em comemoração aos 40 anos de lançamento do primeiro disco da Patrulha do Espaço, que dizem ser o primeiro disco de rock independente do país, junto com os lançamentos de CD e vinil comemorativos. Só o CD saiu e não vai rolar a tour, já o vinil assim que a fábrica voltar a funcionar, irá sair. Quanto ao CaSch, lançamos o CD no ano retrasado e o vinil no ano passado. Foi prensado e cortado nos USA e está demais. Fizemos um show de lançamento, em janeiro deste ano, em São Paulo. Já os shows estão suspensos.
Na Argentina, como falei acima, tinha shows e gravações, em março, que não rolaram, mas em dezembro de 2019 gravamos um trabalho novo que se chama Rompenubes, outro trio, que era para um vinil ser lançado primeiramente no Peru, também parou tudo, o lançamento e uma tour por Argentina, Chile e Peru.

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